sábado, dezembro 15, 2018

Conto de Natal atualizado

Grave

Era uma vez uma criança muito pobre, desfavorecida até ao osso, tiritando por mor do frio assolando inclemente via brechas do sórdido casebre. Pobre mãe, remexendo aguada sopa na panela negra nem tição, simples sopinha em ceia de Natal. Às tantas da desolação, a infeliz criança implorou “Mãe, minha mãe, eu gostava tanto de ter aqui o menino Jesus connosco nesta noite de consoada”.
            A inconsolada mulher pensou optimista na eventualidade da embaixada celestial trazer prolixa comitiva de anjos e assessores, mesmo com o invés de receberem longínquas ajudas de custo, isto porque vindos de tão longa distância, do céu, paredes meias com o infinito. Regalia de trazerem cabazes de Natal, subsídios, suplementos, repórteres televisivos a denunciarem a atroz situação de carência, até o cão se configurava raquítico, sendo agora uma situação até mais susceptível de revolta que a própria fome de uma criança. Em versão actualizada, a mulher antevia cortejo de anjos como se fosse banda filarmónica, trombetas em emotiva repercussão, raio incandescente descendo pela chaminé, o Menino Jesus proclamando singelo “Aqui estou”.
            Posto isso, decerto apóstolos do serviço ao divino catering, peru assado, comida melhorada sem ser exuberante, também nas bodas de Caná o milagre de Jesus Cristo consistiu em transformar água em vinho, a água-pé, nada de champanhe francês.  
            Afinal, a pobre mulher recebeu fria informação celestial - O Menino Jesus não podia descer pela chaminé porque se encontrava em greve.
            Em greve contra o seu Pai, o Senhor do Reino, por causa das injustiças terrenas. Além das outras.

Sem comentários: